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quarta-feira, 2 de maio de 2018

Um dia a mais ou a menos


Náira Maria da Silva Malta, 1.4

 

Um dia a mais ou a menos


M
aria, quarenta e três anos,  mãe solteira de três filhos: Ana, de dezessete anos;  Davi, de doze anos; e Alice, de apenas seis anos. Levanta às 5h30min para ir à luta; para ela, um dia normal como todos os outros.
_ Bom dia, Davi! Levanta-se para ir à escola.
_ Bom dia, mãe!
_Bom dia, Ana e Alice! Está na hora de acordar!
_ Bom dia, mamãe. Disse Alice com a voz mais doce que Maria podia ouvir.
Enquanto Maria prepara o simples café da manhã, ouve barulhos que não são incomuns na periferia em que habita.
Diz Alice:
_ Mamãe, estou com medo. Alguns meses atrás, quando ouvimos esses disparos, papai foi morar com Papai do Céu e até hoje tenho saudades.
_ Não se preocupe, meu amor. Vai ficar tudo bem.
Depois de meia hora de um confronto intenso entre policiais e bandidos, eles conseguem sair de casa: Ana e Davi para a creche e Maria para o trabalho.
_ Boa aula para vocês, meus filhos.
Como Alice ficava o dia inteiro na creche, sua mãe lhe diz:
_ Filha, não saia com ninguém da creche sem ser eu, tudo bem? Mamãe ama muito você.
_ Tudo bem, mamãe. Também amo você.
Um abraço forte e Maria segue para o seu trabalho. Maria é uma pessoa carismática, distribui amor por onde passa. São 12h30min, horário de almoço de Maria, tudo está normal, como qualquer outro dia. Com muita lentidão a hora passa e chega o momento de buscar Alice na creche. Com muita alegria em seus olhos e, principalmente, no sorriso inocente, Alice diz:
_ Que bom que você veio, mamãe. Já estava com saudade.
E então Maria sorri.
Para chegar até sua casa, são dois metrôs e um ônibus. Chega então à primeira estação de metrô. Há muito movimento, pessoas voltando do trabalho, algumas indo ao trabalho, outras indo encontrar pessoas amadas, pessoas tristes, felizes, indesejadas, enfim, vários tipos de pessoas e pensamentos em um só metrô. Maria sente um aperto enorme em seu peito, não sabe o que fazer, pensa somente em seus filhos Ana e Davi. Pega seu telefone e liga desesperadamente para eles.
O telefone chama uma, duas... sete vezes. E ela só escuta:
_Sua ligação está sendo encaminhada para a caixa postal.
Depois de tentar sete vezes para Ana e cinco para Davi, ela então decide deixar sua mensagem na caixa postal:
_ Filha, estou preocupada com você e seu irmão. Assim que ouvir essa mensagem, por favor, me liga.
Conforme chega perto de casa, algumas lágrimas inevitavelmente caem e então Alice pergunta:
_ Mamãe, por que você está chorando?
_Não é nada, filha. Só estou preocupada com seus irmãos, mas ficará tudo bem.
_ bom. Diz Alice com voz de choro.
Chegou, Maria entrou rapidamente, pois queria ver o quão bem seus filhos estavam e era apenas preocupação normal de mãe após 12 ligações não atendidas. Infelizmente, não foi nada que ela desejava ser, havia sangue para todos os lados: chão, sofá cortina...
{Gritos, choros} _ Ana, acorda, filha. Davi, por favor. Não façam isso com a mamãe! Por favor, por favor! _ Gritava repetidamente.
A partir do momento em que Maria viu aquela cena, ela teve certeza de que o céu poderia brilhar todas as manhãs, que os pássaros poderiam cantar, mas que eles nunca mais acordariam felizes  como acordavam todos os dias. Maria só quer paz, poder voltar ao trabalho tranquila, para que outra família não chore alguma perda.
Eram cinco até uns meses atrás, três disparos em menos de sete meses acabaram com aquela família. Agora eram somente Maria e Alice, tentando achar uma paz neste mundo onde vidas são tiradas sem nenhum motivo. Era para ser apenas mais um dia normal, mas foi o pior dia da vida de Maria: dois filhos mortos, uma mãe que chora e a sociedade que vira as costas.

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